domingo, 29 de agosto de 2010

audácia


No âmbito
no âmago
e na ambiguidade
das palavras
não demando apenas
escalas cromáticas
exíguas
Sou demente!
Dê-me uma nota
pois ainda que desafinando
eu canto
em qualquer tom.

.
Lara Amaral umideceu meus olhos em seu "Teatro da Vida"

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Poemicídio

Cezanne - Mount Sainte-Victoire, 1890-1894, National Gallery of Scotland, Edinburgh


Nas emboscadas que faço
Nas armadilhas que monto
Estou no encalço da inspiração
Epifania
Procuro um mote glorioso
que faça-se em mim
o poeta
Que me traga o esplêndido
e definitivo verso
Campeio as planícies
Desvendo planaltos
Esquadrinho vales
montes e escarpas
Mergulho em mares
ajoelho em altares
Estou atrás
da poesia
Não dou um pio
para não afugentá-la
nem nada...
Quero a explosão
orgástica
e suicida
Quero cometer um poema
capital.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Provocação

imagem livre do google

Se o que sinto
nem é amor
Mistifório
de desafeto
e desejo
No ensejo do rancor
No auge da insensatez
Desafio-te
a me fazer querer-te
outra vez.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

muito simples...

Gustavo Rosa - Série banhistas

Abandono-me ao seu lado
que seu instinto sem censura
me salva do meu embaraço em viver.

Resgata-me sempre no último instante
de penhascos de onde por um triz
não desmorono.

Guardião atroz que me traga
do meu particular inferno
e me atira no seu.

Assim faz com que eu tenha que lutar por mim
[como eu jamais lutaria sem ser impelida]

Arranca-me do confortável sofrimento
que constantemente me imponho.

E desmitifica-me
Caçoa de mim

Até que atônita e exausta
eu aceite que tudo é mesmo
muito simples...

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

SEM PIEDADE


De coração perplexo
Cansei de articular
complexos anseios
que já nem me interessam
Salvo engano nem sou poeta
Não sou apoio
Nem estaca, nem espeque
Não vejo o tempo
nem sei a hora
Não tenho escadas ou escora
Não sinto nada
Afeição ignorada
Reconheço-me na aflitude
[amplitude da aflição]
Entre acometimentos
parcos de sentimentalismos
escolho o lado mais tênue do nada
onde a neblina diverte-se
em me enfurecer
pela dor de me saber anódino
Irrito-me por estar inábil
E avisto a poesia por detrás das sombras
que se ri de mim
sem piedade.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Desertada

sandstorm-sahara

A tristeza
corre atrás de mim
Persegue-me
E nada do que eu faça
surte efeito
Nem a fuga
nem o enfrentamento
Não existe alento
A tristeza desertifica-me
Captura e resseca
minha poesia
Volatiliza
Vira poeira e ventania
A alegria
desertou de mim
Já não posso cantar
Já não consigo
Sem música
e sem poemas
converti-me num esplêndido
rancho baldio

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Saudade

Matisse


Mesmo quando longe
Mesmo quando ausente
Mesmo quando e sempre
inexistente
Sua parecença diáfana
Sua transparência
perpetua a sensação
de que transporto um fantasma
E que me possuído
não admite
fazer-me aparição
E mesmo de longe
Mesmo ausente
Mesmo que absolutamente
intangível
Assombra e assoma
por hora e eternamente
A abstraída lembrança
da sua percepção.