domingo, 29 de novembro de 2009

Confissão



Dos sete pecados capitais,
cometo alguns comumente,
uns, mais raramente,
um ou outro, jamais.
Luxúria? Só um pouquinho...
Inveja? Nem um tiquinho!
Ira? Nem sempre com quem merece.
Avareza? Nunca! Verdade!
Da Soberba, só a vaidade
Admito a insofismável Gula.
Mas o pecado dileto
Que reincido todo dia
É a danada da Preguiça
nome, que por analogia,
São Tomás de Aquino
deu à Melancolia.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

de mim



Quando pensei me conhecer
enxerguei-me um quebra-cabeças
de peças dispostas aleatoriamente
confuso, difuso e disperso.

um mosaico...

Aos poucos, me olhando melhor
achei que fazia sentido
o padrão dos desenhos
da minha alma refletida
num espelho de imagens repetidas

um caleidoscópio...

Já hoje, me sabendo cada vez menos
sob o olhar arguto da vida

Sei eu:
Múltiplos caleidoscópios
de um enorme mosaico indefinido
refletido em espelhos quebrados

Sou eu...

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

cara a cara



Andei visitando
meu rosto no espelho
Analisei cada ruga
Não preenchi as emoções
com plásticas ilusões...

Refiz expressões

Vi pregas de sorrisos largos
"Pés-de-galinhas" causados
por olhinhos apertados
Resultados
de gargalhadas
muito bem dadas

Ora vejam!
Mais dois vincos...
Bem aqui
entre sobrancelhas
São apenas centelhas
de alguma preocupação

Nos lábios mais dois
e outros dois
Quatro novas marcas
de viver...

Já sorri
Gargalhei
Fiz muxoxo
Já chorei
Encantei-me...

E quem diria:

Percebi que a tristeza
até envelhece
Mas o que deixa marcas
do bom combate
é a alegria!

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Instrumento



Sou um instrumento construído por um "luthier" embriagado
Mas quem me toca
não desafina:
Eu o chamo de Deus.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Não é interessante?



A noite está agradável, meu amor. Morna como uma noite de início do verão.

Não posso dizer que noites assim me lembra você, porque quase nada me faz lembrar você ou nós.

"Nós" foi um delírio meu, um desvario, um sonho. Nunca existimos realmente.

Passamos juntos alguma noite de verão? Não me lembro..
.
A noite está quente hoje, meu amor, mas uma brisa suave me traz o perfume das camélias que moram no quintal vizinho e camélias também não me lembram você. Aliás, flores não me traz nenhuma lembrança sua.

No céu, relâmpagos anunciam uma tempestade  e tempestades também não me lembra você.

Tenho certeza que nunca compartilhamos uma tempestade, não é mesmo, meu amor?

Não consigo vislumbrar a lua atrás das nuvens pesadas. Nem mesmo o reflexo do luar. Mas, surpreendentemente, a lua me lembra você... Você sabe...

Mas hoje não tem luar.

Eu penso em coisas quando me lembro de você e não o contrário como seria natural.

Sabe mesmo o que me lembra você, meu amor?

Vidraças...

Quando eu penso em seus olhos claros, minha mente logo imagina vidraças, janelas de um ônibus partindo de um terminal do passado para nunca mais voltar.

Penso em como teria sido se não tivesse partido...

Quase nada me lembra você, meu amor, no entanto, eu não te esqueço um só instante...

Não é interessante?

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

improvisos...




Sou tão apenas uma aprendiz da poesia. Uma amadora das palavras. Uma estagiária. Iniciante...

Como o músico jovem que ama o ofício, mas em sua empolgação com as descobertas, impõe notas demais nos improvisos, para experimentar irreverente o desafio até o fim.

Exagera, até que a maturidade vai educando lentamente e ensinando que muitas vezes "menos é mais", e que uma nota sublime substitue dezenas de notas desperdiçadas em demasia.

Mas minha intensidade não é intencional, sou apenas a expressão do que ainda sinto.

É minha verdade que predomina, nem sempre a minha vontade.

Eu escrevo no limite mesmo. Quase no limiar entre o "forte demais", como muitos consideram - e conheço meus entraves para a concisão - mas é assim nessa intensidade que encontro o meu eixo, que exorcizo os meus demônios.

É a minha forma de procurar a minha vaga, se é que existe. O meu lugar de descansar...

Quem sabe um dia, eu consiga resumir os excessos de notas na minha poesia, os exageros das minhas palavras.

Ainda imatura, expresso-me densamente, com a gravidade da minha dramaticidade aguçada por sensações e emoções intensas. Exponho minhas dores, sob as vistas da minha lupa, cuja lente aumenta e aumenta até doer tanto que se anestesia sozinha.

Minha habilidade em subtrair palavras e dizer levemente "muito com pouco" é parca. Quem sabe, não seja uma imperfeição ou defeito, mas apenas o "meu jeito".

Presunçosa, por vezes, quero crer que seja o meu "estilo", essa vocação para extremar e espremer o sumo das emoções até o bagaço.

Exibo tudo de mim corajosa e irresponsavelmente como uma criança, de forma a me expor tão inteira no que escrevo que por vezes me sinto incomodamente nua.

Eu despejo, vomito, desabo e desabafo em palavras (que gosto tanto), com o único intuito de deter em mim esse trânsito de pensamentos e sentimentos que me esgotam. Não chega a ser "confusão mental", mas me confronto ininterruptamente e sem piedade.

Sonho em relaxar, repousar serena, como as cenas bucólicas de um quadro impressionista, transformando minha mente num lago tranquilo, de águas rasas e seguras.

Me finjo de rasa, me pinto de rosa pela vida afora, mas em mim, não existe garantia de paz. Sou uma pedra rolando ladeira abaixo. Muitas pedras. Avalanche...

E quando isso acaba; resta eu, uma explanada poeirenta, exausta, mas aliviada por ter onde sossegar.

Talvez seja por isso mesmo que me expresso. Não por um mote artístico, mas por questão de sanidade.
Pretexto menos sublime, mas não menos consolador.

Talvez, a necessidade expressar-se, seja o combustível que movimenta o motor que incentiva todas as artes, todos os artistas, em busca do confortável vazio emocional.

Talvez...

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

fazendo as contas...



Tenho levado sustos na vida
Calculei mal as expectativas
E a muito custo me refaço
Contabilizei demais os prejuízos
e tenho esquivado a viver o bônus
Contando agora
o bom tempo que me resta
Eu deveria é fazer festa
todo dia
Para celebrar momentos
como o agora
Em que me encontro
viva e respirando
Tenho conforto material
Tenho certa sanidade mental
e algum lenitivo emocional
Tenho saúde e tenho pão
Me falta apenas
uma coisinha
Que impede
um festejo retumbante
Conseguir viver
sem paixão...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Reclusão



Ando sentindo tristeza
todo santo dia
Uma cava no peito
um vazio
Falta de não sei quê
Que cismei até de estar
chegando ao fim
Por falta de espaço
em caber tanta
tristeza em mim
Anda essa
a transbordar
pelas minhas gavetas
abertas
No amassado dos lençóis
Nos meus olhos que vazam
e na fuga sintomática do sol
Ando gostando
de ficar no escuro
Gostando da reclusão
e da clausura
Com medo de pessoas
e de venturas
Evitando qualquer
comoção
Privando-me
dos meus sentidos
Preferindo lassidão
e tédio
Assim após o exposto
Desabo nos travesseiros
Aguardo ainda insone
o efeito do remédio...
- I want to be alone!