sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Esperança



Não tive um conto de Natal
Não tenho um conto de réis
Não terei um conto de carochinha
A vida é um conto do vigário

A saudade é crônica
e a paixão é poesia


No final das contas
quem diria
ainda tenho esperanças...

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

como vento


Barcos de pescadores em Saintes-Maries-de-la-Mer-1888 © Van Gogh Museum, Amsterdam


Sou meio assim
como o vento
De grandeza
vetorial
Teria que ter
sentido
(mas não faço)
E direção
(mas disperso)
Velocidade
Ventania...
Sou ar
em movimento
Não fixo
Levanto a poeira
sou o pó
Causo atrito
Fricção
Volatizo
Evaporo
Se fosse do mar
seria o sal
E embora
não me enxerguem
Sou totalmente
real.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

futuro


Foto: O Globo.

Na lente transparente
Olho de perto
a semente
Desenho de gente
Desígnio
Destino
O que será
desse menino?

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A natureza humana




A natureza humana
desperta-me espanto
Os desejos bizarros
provocam-me desencanto
As vezes até me comovo
com a infinitude das dores
Mas ando mais assombrada
E enojada amiúde.
Confiro autenticidade
a toda forma de expressão
Censura, jamais!
Nunca mais!
Ainda assim me engulha
algumas manifestações
Tem quem se identifica
com perversidades
perfídias e perversões
Sei que pra tudo tem gosto
Aguda devassidão
Mas diante do indivíduo
humano descomposto
Meu lírico coração
se avexa
de desgosto.

Freud! Me explica?

sábado, 5 de dezembro de 2009

devoção


Foto:Olivier Taugourdeau


Devotei-me a ti
sem nenhum respeito
Impertinente
fiz-me beata
Ajoelhei aos teus pés
te constrangendo
E ofereci canções
sem advérbios
Orações e versos
censuráveis
Esquadrinhando
o mundo atrás de ti
Cavoucando o passado
Provocando o presente
Cobrando futuro
Tantas vezes
inconvenientemente
Que mais incomodei
que agradava
Que mais afastei
que aproximava
O que eu não via
é tão simples
agora eu sei
Você apenas
não me queria
Nem o apego
que te dediquei.

domingo, 29 de novembro de 2009

Confissão



Dos sete pecados capitais,
cometo alguns comumente,
uns, mais raramente,
um ou outro, jamais.
Luxúria? Só um pouquinho...
Inveja? Nem um tiquinho!
Ira? Nem sempre com quem merece.
Avareza? Nunca! Verdade!
Da Soberba, só a vaidade
Admito a insofismável Gula.
Mas o pecado dileto
Que reincido todo dia
É a danada da Preguiça
nome, que por analogia,
São Tomás de Aquino
deu à Melancolia.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

de mim



Quando pensei me conhecer
enxerguei-me um quebra-cabeças
de peças dispostas aleatoriamente
confuso, difuso e disperso.

um mosaico...

Aos poucos, me olhando melhor
achei que fazia sentido
o padrão dos desenhos
da minha alma refletida
num espelho de imagens repetidas

um caleidoscópio...

Já hoje, me sabendo cada vez menos
sob o olhar arguto da vida

Sei eu:
Múltiplos caleidoscópios
de um enorme mosaico indefinido
refletido em espelhos quebrados

Sou eu...

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

cara a cara



Andei visitando
meu rosto no espelho
Analisei cada ruga
Não preenchi as emoções
com plásticas ilusões...

Refiz expressões

Vi pregas de sorrisos largos
"Pés-de-galinhas" causados
por olhinhos apertados
Resultados
de gargalhadas
muito bem dadas

Ora vejam!
Mais dois vincos...
Bem aqui
entre sobrancelhas
São apenas centelhas
de alguma preocupação

Nos lábios mais dois
e outros dois
Quatro novas marcas
de viver...

Já sorri
Gargalhei
Fiz muxoxo
Já chorei
Encantei-me...

E quem diria:

Percebi que a tristeza
até envelhece
Mas o que deixa marcas
do bom combate
é a alegria!

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Instrumento



Sou um instrumento construído por um "luthier" embriagado
Mas quem me toca
não desafina:
Eu o chamo de Deus.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Não é interessante?



A noite está agradável, meu amor. Morna como uma noite de início do verão.

Não posso dizer que noites assim me lembra você, porque quase nada me faz lembrar você ou nós.

"Nós" foi um delírio meu, um desvario, um sonho. Nunca existimos realmente.

Passamos juntos alguma noite de verão? Não me lembro..
.
A noite está quente hoje, meu amor, mas uma brisa suave me traz o perfume das camélias que moram no quintal vizinho e camélias também não me lembram você. Aliás, flores não me traz nenhuma lembrança sua.

No céu, relâmpagos anunciam uma tempestade  e tempestades também não me lembra você.

Tenho certeza que nunca compartilhamos uma tempestade, não é mesmo, meu amor?

Não consigo vislumbrar a lua atrás das nuvens pesadas. Nem mesmo o reflexo do luar. Mas, surpreendentemente, a lua me lembra você... Você sabe...

Mas hoje não tem luar.

Eu penso em coisas quando me lembro de você e não o contrário como seria natural.

Sabe mesmo o que me lembra você, meu amor?

Vidraças...

Quando eu penso em seus olhos claros, minha mente logo imagina vidraças, janelas de um ônibus partindo de um terminal do passado para nunca mais voltar.

Penso em como teria sido se não tivesse partido...

Quase nada me lembra você, meu amor, no entanto, eu não te esqueço um só instante...

Não é interessante?

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

improvisos...




Sou tão apenas uma aprendiz da poesia. Uma amadora das palavras. Uma estagiária. Iniciante...

Como o músico jovem que ama o ofício, mas em sua empolgação com as descobertas, impõe notas demais nos improvisos, para experimentar irreverente o desafio até o fim.

Exagera, até que a maturidade vai educando lentamente e ensinando que muitas vezes "menos é mais", e que uma nota sublime substitue dezenas de notas desperdiçadas em demasia.

Mas minha intensidade não é intencional, sou apenas a expressão do que ainda sinto.

É minha verdade que predomina, nem sempre a minha vontade.

Eu escrevo no limite mesmo. Quase no limiar entre o "forte demais", como muitos consideram - e conheço meus entraves para a concisão - mas é assim nessa intensidade que encontro o meu eixo, que exorcizo os meus demônios.

É a minha forma de procurar a minha vaga, se é que existe. O meu lugar de descansar...

Quem sabe um dia, eu consiga resumir os excessos de notas na minha poesia, os exageros das minhas palavras.

Ainda imatura, expresso-me densamente, com a gravidade da minha dramaticidade aguçada por sensações e emoções intensas. Exponho minhas dores, sob as vistas da minha lupa, cuja lente aumenta e aumenta até doer tanto que se anestesia sozinha.

Minha habilidade em subtrair palavras e dizer levemente "muito com pouco" é parca. Quem sabe, não seja uma imperfeição ou defeito, mas apenas o "meu jeito".

Presunçosa, por vezes, quero crer que seja o meu "estilo", essa vocação para extremar e espremer o sumo das emoções até o bagaço.

Exibo tudo de mim corajosa e irresponsavelmente como uma criança, de forma a me expor tão inteira no que escrevo que por vezes me sinto incomodamente nua.

Eu despejo, vomito, desabo e desabafo em palavras (que gosto tanto), com o único intuito de deter em mim esse trânsito de pensamentos e sentimentos que me esgotam. Não chega a ser "confusão mental", mas me confronto ininterruptamente e sem piedade.

Sonho em relaxar, repousar serena, como as cenas bucólicas de um quadro impressionista, transformando minha mente num lago tranquilo, de águas rasas e seguras.

Me finjo de rasa, me pinto de rosa pela vida afora, mas em mim, não existe garantia de paz. Sou uma pedra rolando ladeira abaixo. Muitas pedras. Avalanche...

E quando isso acaba; resta eu, uma explanada poeirenta, exausta, mas aliviada por ter onde sossegar.

Talvez seja por isso mesmo que me expresso. Não por um mote artístico, mas por questão de sanidade.
Pretexto menos sublime, mas não menos consolador.

Talvez, a necessidade expressar-se, seja o combustível que movimenta o motor que incentiva todas as artes, todos os artistas, em busca do confortável vazio emocional.

Talvez...

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

fazendo as contas...



Tenho levado sustos na vida
Calculei mal as expectativas
E a muito custo me refaço
Contabilizei demais os prejuízos
e tenho esquivado a viver o bônus
Contando agora
o bom tempo que me resta
Eu deveria é fazer festa
todo dia
Para celebrar momentos
como o agora
Em que me encontro
viva e respirando
Tenho conforto material
Tenho certa sanidade mental
e algum lenitivo emocional
Tenho saúde e tenho pão
Me falta apenas
uma coisinha
Que impede
um festejo retumbante
Conseguir viver
sem paixão...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Reclusão



Ando sentindo tristeza
todo santo dia
Uma cava no peito
um vazio
Falta de não sei quê
Que cismei até de estar
chegando ao fim
Por falta de espaço
em caber tanta
tristeza em mim
Anda essa
a transbordar
pelas minhas gavetas
abertas
No amassado dos lençóis
Nos meus olhos que vazam
e na fuga sintomática do sol
Ando gostando
de ficar no escuro
Gostando da reclusão
e da clausura
Com medo de pessoas
e de venturas
Evitando qualquer
comoção
Privando-me
dos meus sentidos
Preferindo lassidão
e tédio
Assim após o exposto
Desabo nos travesseiros
Aguardo ainda insone
o efeito do remédio...
- I want to be alone!

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

" ... "



Caminho sem veemência
e não limpo mais meus sapatos
Eu carrego inconsequente
cavacos e dejetos
Nem varanda
nem terraço
Sou escada ou rampa
que desce para o nada
Sem corrimãos
guarda-corpos
ou segurança
Refém dos meus
próprios alvitres
já não sonhos os sonhos
que não se consumaram
Nem possuo mais
os anseios impuros
que restaram impunes
Desabo atravessando o ar
como um disparo
Trago nas mãos o revólver
que me aponto todo dia
Que se danem as cordas
que enforcam
As facas que cortam
e os pecados...
Que explodam num tiro
todos os meus sentidos
Porque sentido
já não faço
E para eu desistir
só falta escolher um bom vestido
O resto é mera formalidade...

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

filhinha



foto paulolima

Não importa o quanto
pense que cresceu
minha filhinha
Não me deixe perceber
Não importa o quanto
se ache independente
menininha
Mente...
Mente pra mim
Diz que precisa de colo
Seja paciente
Porque necessito assim
Ainda banhar-te devagarzinho
fazer espumas de (a)mar
que te escorram pelos dedinhos
Depois lavar-te os cabelos
passar xampu aos pouquinhos
Vendo a brincadeira te encantar
E acarinhar-te com gotas d'água
como se fosse o bebezinho
que você costumava ser
Brinca comigo anjinho
Para que eu possa deter
o tempo só um pouquinho
E possa reter-te comigo
ao menos na lembrança
Ate que eu consiga enfim
deixar você crescer...

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

composição


Chet Baker

Você me toca
como você toca
Notas longas
lentamente
Semibreves e harmônicos beijos
delicadamente
E de repente inesperado
investe intensamente
improvisa em mim
imprevisíveis solos
audíveis somente
pelos sentidos
Compõe nas pautas
que me risca as costas
com as digitais
Melodia sensual
tátil
Dedilhando arrepios
Como se em mim
houvesse um pistão
em cada ponto
que pressiona
Sopra-me essência
e desejo
E seu ritmo perpassa
transpassa e ultrapassa
meus sentidos
Acelera e sobe o tom
Semínimos toques
Fortíssimo
Rápidos
Agudos
Até que eu me faça bailarina
e me dissolva
em gotas
musicais...

sábado, 10 de outubro de 2009

assim




Por vezes me surpreendo com as conclusões equivocadas, ou não, sobre meu íntimo confuso.
Já me disseram que sou o tipo de gente feita para ser baldia, mas eu sei que meu coração é um latifúndio infinito loteado e totalmente ocupado por milhões de outros corações.
Cabe em mim uma infinitude de almas que amo, que desejo e quero bem.
Cabe em mim, uma gama de cores maior que a caixa de lápis que guardei a vida inteira, cores de todos os tons, vários tipos de amores, com muitos nomes e qualificações.

Talvez tenham razão quando dizem que sou fugidia.
Sou controversa, mas (infelizmente) não sou contraventora.
Reflito, reajo, remendo, mas não me emendo
Eu dou a corda, mas não me ato.
Evado-me...
É que meu coração é passarinho rápido.
É colibri.
Vôo e vou de flor em flor, encantada e não paro muito em lugar nenhum.
Até sou de muita conversa, mas de pouco tempo com os mesmos assuntos.
Sou um pouco como o vento.
Surjo revôo e passo.
Tenho a mente ventilada, multifacetada, mas estilhaçada.
Tenho a alma intempestiva, mas introvertida.
Sei que sou divertida, mas nem todo mundo acha.
Platéia sem talento...
Às vezes - confesso - me esquivo, mas ainda assim vou seguindo.
Escapo feito fumaça que deixa o cheiro, mas passa.
Assim.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Das ressalvas




Não vou tecer um público poema
E impudica expor a minha vida
Quero fazer segredos do meu tema
E não deixar minha alma confrangida


Não têm que saber que sou aquela
Basta que sintam minha eufemia
Pois os olhos que me olham da janela
Detectam a minha nostalgia


Se me escancaro sei que rarefaço
Não quero um manifesto da poesia
Só roubo do Lácio a última flor


Não para expor meus versos escassos
Segredos da alma e sua atonia
Mas só tornar pública a minha dor.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

MPB




Benditos os convidados
para a ceia de talentos!
Banquete de metáforas.
Saudade sem alento...
“Vini” velho “camará”...
Por onde andará?
Antonio Brasileiro...
Jobim dos “Passarim”...
Voa livre, outrossim!
Caro ministro!
Ganhaste um
presente sinistro
para um poeta tão hodierno
Aliás, mais que moderno!
Gil das conclusões inusitadas,
inesperadas
poesia ora pura, ora dura.
Legítima melodia
Buarque, “mulher macho”!
Impressionante sensibilidade
O melhor de mim feito em poema
O melhor da viagem feita em canção.
Veloso, como foi doce
despojamento espantoso...
Precioso tempo
sem lenço nem documento...
Sem “discos de ouro”...
Que tesouro!
Lembro Elis...
Porque tão infeliz?
se tinha o de melhor pra cantar...
Ivan, sempre inventivo e discreto
Gonzaguinha, fecundo, direto
Djavan, um glossário
Um dicionário!
Meus poetas musicais
Meninos que não encanecem
jamais para meus ouvidos
Apenas duvido que haja
banquete desse requinte
Em algum tempo seguinte.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

abatimento


Indigna já não levito
Em lástimas estréio
meu alforje de farrapos
Eu ardo como ardem
as chagas tatuadas
Latejo e inflamo
e lambo as minhas
feridas
Perpetuo a mágoa
cultivando cicatrizes
Desprovida de alma
o corpo não se acalma
E suspensa em dores
Dissipo solitária
Um singelo arcanjo
exausto e abatido...

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

cuidado...



Nunca é tarde pra se perder na vida
Até hoje eu tento andar nos trilhos
pois que qualquer distração eu descarrilo
e me acabo num vício ou num exílio.

Nunca é cedo pra se perder o bonde
Não existe um só ponto sem perigo
pois que qualquer desvio, um desatino
virá nas noites más um bom castigo

O destino é traiçoeiro e ardiloso
é uma rede tecida com finos fios
romper-se a trama é fácil e perigoso
mergulho sem volta em denso rio

Cuida bem, pondera, pensa muito
porque num instante tudo está perdido
É sutil o portal entre o que não presta
e a armadilha sedutora dos sentidos

A munição é pesada, a guerra, insana
Eu mesma me vigio todo dia
e todas as noites eu me policio
pois que senão me entrego aluada
às tentações devassas e mundanas
e me abandono às perdições desavisada
e inexoravelmente desvario....
.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Chorinho



Vai-se nume
sonho e encanto
Vem silêncio
e afasia
Decanto
sem canto
e sem poesia
Me faço água salgada
Que bóia
dos olhos da alma
e entorna...

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

FALTA FALTA


Flor do cerrado - imagem gentilmente cedida por Jorge Stark Filho


Ando sentindo falta da falta tua
Da falta que me fazias
Da tua falta que me inspirava
nas jornadas da elegia
Mas depois de desesperar
da tanta falta que havia
parece que fiquei vazia
Despoemei as entranhas
Já não mais me acometia
o antigo e estóico lirismo
E a linguagem se atrofia
Estando então eu assim
tão oca e despreenchida
da tua falta em mim
desencantei da poesia.
.