quarta-feira, 4 de março de 2009

Caprichoso

Já escrevi histórias sobre músicos. Gosto de brincar de “contar história” como os antigos da tribo, em volta das fogueiras nas grandes clareiras das florestas; ou como os velhos em suas cadeiras de balanço na varanda de suas casinhas caipiras caiadas de tabatinga.
Voltando aos músicos, tenho lá certa conivência com eles, talvez por fatores genéticos. Meu avô paterno, Henrique Maziero, era músico.
É sobre ele a história que vou contar. Segundo narrava meu saudoso pai, vovô era um gênio musical. Informações suspeitas, visto que meu pai era seu fã mais ardoroso.
Vô Henrique, que não tive a graça de conhecer, era saxofonista, clarinetista e requintista (tenho dúvidas ser este o nome correto para quem toca requinta, que é um instrumento de sopro primo-irmão do clarinete).
Era - segundo papai - talentoso executante, arranjador e compositor de choros e valsas que ficaram famosos na época, mas que por necessidade foram vendidos no Rio de Janeiro para outros “compositores”... Lenda?
Meu pai elogiava também as partituras escritas pelo meu avô: - Parecia impressa ou feita com régua e “bolômetro”, tal o capricho!
Caprichoso ou não nas partituras, parece que meu avô paterno esmerava também na vida. Era membro da Banda de uma pequena cidade do interior de São Paulo (Piquete) encravada na Mantiqueira, “boquinha pra Minas”. Pertencia também à “Jazz Band” da Fábrica de pólvora da cidade e, sem trocadilhos, explodiam na época as “Big Bands” norte-americanas.
Vovô, segundo soube, só não era muito disciplinado. Mestre em faltar ensaios ou chegar atrasado. - Mesmo sem ensaiar, tocava de prima, leitura impecável! Informações obviamente paternas.
Mas, se meu avô era impontual no serviço, primava pela assiduidade em casa. A maior prova disto está na quantidade de filhos! Fez um montão. Nove ao todo, só com minha avó... No contrabando não se têm informações.
Tão “vidrado” em música que, exceto meu pai, um tio e uma tia (três em nove), os filhos receberam de “presente” nomes de músicos ou maestros italianos: Rossini, Tosquini, Belini, Paganini, Toscanini e a caçula, recebeu, numa singela homenagem ou pedido de socorro, o nome da Santa Padroeira dos músicos, Cecília.
Não me consta que algum “desses virtuoses” tios tocasse sequer um pandeirinho, para desapontamento de meu avô.
Assim, claro, com tantas bocas para alimentar, não pode seguir carreira na capital. O negócio era extravasar o talento por ali mesmo.
Numa noite de boemia, encontrava-se num restaurante localizado num posto de gasolina na entrada da cidade, caminho para as Gerais, quando “pintou no pedaço” o já famoso Waldir de Azevedo com seu grupo de chorinho.
Iam jantar antes de galgar a serra para uma turnê no sul mineiro. Evidente que logo se “enturmaram”, coisa comum entre músicos. Papo vai, papo vem, e lá foi meu avô buscar o saxofone em casa: - Vou dar uma palhinha com os moços lá da capital, mas volto logo! – Justificou para a crédula e inocente vovó.
Para encurtar a história, voltou quinze dias mais tarde e um pouco mais magro, barba por fazer e feliz da vida.
Única explicação em casa e no serviço:
- Tava uma chuvarada lá em Minas!
Caprichou!

4 comentários:

Raul de Sá disse...

Muito legal!

Anônimo disse...

Obrigado por Blog intiresny

Batom e poesias disse...

Legal sua vinda, Raul.

Batom e poesias disse...

De nada Anônimo.