quinta-feira, 11 de junho de 2009

Quando eu canto

Juro que não estou me gabando, mas fico impressionada com minha própria "capacidade" mental de pensar (pleonasmo hiper vicioso) e fazer várias coisas ao mesmo tempo. Não significa obviamente, que sejam todas profícuas ou positivas, muito menos que eu seja competente por conta disso. Pelo contrario! Me vejo atolada e atordoada com tantos pensamentos durante alguma atividade e isso me faz perder o foco, diluindo minha atenção. Explico-me. Na véspera de feriado, fui contratada para cantar num hotel bem bacana em Campos do Jordão, cujos responsáveis calcularam mal a "animação" dos hóspedes que estavam chegando para o feriado de "Corpus Christi". Promoveram várias atividades, entre elas uma cantora (eu) e um pianista no bar da lareira. Quem conhece Campos sabe que é uma cidade bastante fria nessa época do ano e o chamado bar da lareira desse hotel especificamente, é bastante aconchegante. Já cantei ali várias vezes. O fato é que os hóspedes passavam sucessivamente pelo bar em direção ao restaurante, ouviam um pouquinho de música e iam jantar. Esvaziava de novo. Tudo bem, pois depois do jantar, é de praxe parar por ali, tomar um licor, fumar um charuto (hargh!), e curtir uma "boa" música. Alguma coisa deu errado... Eles jantavam e desapareciam. Especulei o que poderia ser. Talvez porque o bar da lareira era o lugar onde os apreciadores de charutos se encontravam e agora é proibido fumar no local que antes era destinado a eles. Confesso que para uma cantora, isso é muito melhor. Cantar e inalar fumaça de charutos cubanos é difícil... Enfim, o fato de ser proibido fumar ali pode ser um dos motivos do esvaziamento do local. Tentando ser justa, imaginei se eu estava cantando mal, ou se o repertório não era do agrado, ou quem sabe, (amenizei para o meu lado) estavam apenas, todos muito cansados da viagem já que a faixa etária de frequentadores do dito hotel é bem acima dos quarenta. Enfim, cantei a noite inteira para meia dúzia de "gatos pingados". Isso não me afeta muito (só um tantinho), mas a troca de energia numa apresentação é cinqüenta por cento do sucesso dela. Quando a voz vem do coração ela é muito mais bonita. Quando parei de cantar em bailes, alguns anos atrás e resolvi cantar em bares, já se foram centenas de madrugadas e já houve muitas noites memoráveis e outras nem tanto, em que cantava para manobristas e garçons. Não que estes trabalhadores da noite não mereçam um tostão da minha voz, mas é muito frustrante quando acontece de não ter público. Existe só uma coisa pior que falta de público, é quando eles estão presentes só de corpo. Como diz Jô Soares, é quando a platéia não é talentosa. Não vou me culpar, porque na maioria das vezes o meu repertório funciona muito bem para esse trabalho. Voltando ao que eu queria dizer, é que enquanto eu cantava, tudo isso me veio à cabeça e não sendo o suficiente para me distrair, ainda comecei a filosofar acerca da vida. Fiquei pensando porque estamos por aqui, nesse planeta de provas e expiações, e o que fazer quando não se tem mais grandes paixões, nem muitos sonhos, nem motivação. Eu cantava e pensava (ao mesmo tempo e sem controle), como viver é sem sentido, e o quanto estou me sentindo triste sem saber bem por quê. Provavelmente, se o bar estivesse cheio, com pessoas ouvindo e apreciando eu me sentisse diferente, mas naquele momento me veio essa dor das dúvidas existenciais. Tudo tem passado muito rápido e pouco consigo reter. Junto com cantar, ler a letra (porque eu não consigo decorar nenhuma), sentir-me depreciada e filosofar, eu ainda tinha um poema que insistia em querer se fazer, mas que eu o detive antes que me perdesse ainda mais. Era um poema sobre quem não está mais amando ou apaixonado por nada nem ninguém e o quanto isso torna a vida estranha, triste e sem sentido. É como ter desistido de viver. Era um poema sobre um amor que saiu à francesa, foi deixando o outro devagarzinho, até desaparecer, não sem antes magoar bastante. Um poema de sobrevivência. Enfim, ele não sobreviveu. Morreu antes de nascer. Existem poemas assim... Que ficam morando só no pensamento e depois dispersam-se como as sensações momentâneas. Esse escrito é só um texto sem compromisso, sem intenção. É só um desabafo esquisito, uma constatação do quanto tudo é efêmero. Só pra terminar de compartilhar meu desvario noturno, enquanto fazia tudo o que já descrevi, ainda notei quase sem querer, a ostentação das pessoas entre botas caras, casacos de peles, bolsas de grife e me veio à cabeça os milhares de brasileiros que passam fome e frio e o quanto esse nosso país é desigual e injusto. Acho que não quero mais cantar...

13 comentários:

R.Vinicius disse...

Hum. Não sabia que a senhorita cantava. Eu gostaria de ter voz para cantar, mas não fui agraciado com o talento, ou com uma voz bonita. Se eu a tivesse cantaria Jazz, estilo Sinatra, Bublé. Acho incrível a capacidade que a mulher tem para fazer várias coisas ao mesmo tempo. Já foi comprovado que o motivo está nas conexões do cérebro. A mulher consegue usar bem ambos os lados, enquanto o homem usa melhor um lado e mais o menos o outro (mas claro não é consenso que seja assim com todos os homens, e com todas as mulheres) De qualquer maneira é incrível. Sobre o poema lembrei Drummond que dizia "..penetra no reino surdo das palavras .. lá estão os poemas que esperam serem escritos."

Abraço,

R.Vinicius

Batom e poesias disse...

Pois então Vinicius, meu repertório tem de tudo, inclusive muito jazz, bossa nova, e também várias músicas que o Sinatra gravou.
Legal saber que você gosta.
Adorei o poema de Drummond.
Bem lembrado.
Abçs

Unknown disse...

Linda postagem Rossana!

Humana, real!

Conheço muito Campos de Jordão e seu frio que sá anima algunas cantores. Parabéns por mais esta arte.

O poema que ficou retido, certamente seia dedicado amim.

Amei seu pos!

Beijos

Mirse

Rossana de Fátima Mazza Rossana Masiero disse...

Mirse querida, para você eu queria ser capaz de escrever um poema-luz, um poema-cúmplice, um poema-mulher.
Quem saiba ele ainda venha a nascer...
Beijos

Whesley Fagliari disse...

Amiga Rossana,

Vida longa ao amor sempre, minha amiga!

Adorei saber que tu canta, grata surpresa muito feliz... Dou-te uma sugestão, humilde e despretenciosa: poste um vídeo seu cantando algo que gosta... Nós, seus seguidores, adoraríamos...

Luz e paz!

Com carinho,
Whesley

Batom e poesias disse...

Obrigado querido amigo

Não sou muito boa com coisas práticas...rss
Mas quem sabe uma hora dessas eu abuso dos meus amigos blogueiros, e posto um vídeo cantando, assim que eu aprender a fazer isso.

Grande abraço

cristinasiqueira disse...

Oi Rossana,

Quanta semelhança na vida das mulheres que amam como crianças.E voce canta,e voce se espanta e voce perde o tom quando percebe na platéia perdição e inconstãncia.Cante para a gente,cante
para se apaziguar tecendo o tapete para as palavras que vêem.E vêem...e deixa vir.
Quero lhe deixar um poeminha meu

Madureza,idade de mais certezas?/
Esparsas dúvidas/
Grandes arrepiod/
Um gosto por iguarias/
O desprezo pela mesquinhes.

O alheio não pertence a sua alma intensa.
Cante,por favor,cante.
Te aplaudo em pé!

Com carinho,

Cris

Batom e poesias disse...

Querida Cris
Estava com saudade...
Passei várias vezes por tua casinha, pois estava sentindo falta de teus escritos.

Eu cantarei sim Cris, enquanto puder, pois que é o que mais gosto de fazer nessa vida além de escrever... e porque o instante existe...

Para o teu lindo poema eu acrescento que madureza també é tempo de extrema beleza.

Que bom que voltou!
bjs no coração

Mustafa Şenalp disse...

Çok güzel site. :)

Cavaleiro dos Dragões disse...

Rossana
vim conhecer o blog e adorei, apesar de ser de Santos, hoje estou na sua terra! Na vida nada é por a toa, risos!
Um beijo

Batom e poesias disse...

tesekkürler Mustafa!

Batom e poesias disse...

Ei Cavaleiro, isso é mesmo uma coincidência. Passei pelo teu blog e tb gostei muito.
bjs
Rossana

Cavaleiro dos Dragões disse...

tem msn?